GUERRA DE ALEGRIA
Os reis ricos e rainhas do medo
Em suas vivendas atrás das cercas
Mapeiam, gritam e às vezes brandam.
Noutras, suas febres ardem e rasgam
Os pés e as mãos dos escravos.
Tempo de retardos!
Desencontrados, vivemos triturando
Vidros, plásticos e ácidos.
De tais espetáculos
Jorram jatos de sangue e
Saltam estilhaços e afins.
Dor comum, palavra comum, boca comum.
Mas toda vida há vilas, ocas,
Escolas e teatros de rua
Dispostos a cantar na cidade,
Derreter o mármore, ocupar
Espaços e moradas vazias e
Destronar as oligarquias.
Aí estão muitos seres participando:
Cães, crianças, mulheres e homens,
Pássaros, fantasmas e plantas que
Vivem a miséria e a força na Terra.
Outras figuras, vozes, gestos, existências em coro
Estão ao redor da mesma fogueira da sobrevivência.
E quando entram no espaço-tempo do estrondo
O comum vibra, o comum tem gosto,
O comum retira o véu que cobre seu rosto,
Vem de dentro e vem de fora
O impulso e a coragem
Do oculto libertado.
Do jogo invisível surge então o mistério
Que concretiza no presente o poço
Dos desejos revolucionários.
É a possibilidade de agir a gerar o impossível:
É a poesia porteira potente ponte portante da loucura.
Fragmentos e palavras de liberdade
Insurgem dessas paixões incomuns,
Vestidas de vermelho. Ouve-se:
"Venham, plantas da Natureza!
Venham, pingos da chuva!
Venham, cachorros e urubus!
Venham, tucanos e tamanduás!
Vamos, guerreiros, andemos já!
Venham em guerra de alegria!
Estamos lhes dizendo Amizade!
Sorria, Maravilha!
A carne é mortal!
A vida é eterna!
É Primavera, Baby!
A gente já começou!
Exaltação da Beleza?
Com certeza, com certeza!
Em estado Odara
Cada parte devida ao povo!
Toda hora é para triunfarmos
Sobre nosso mundo de grades!
Se queremos transformar os palcos capitais
Vamos ouvir poesias africanas e ancestrais
Vamos ver o Ilê Ayê passar
Vamos ver a fogueira das mariposas e içás
Nos dar a luz e
Vamos sentir os cheiros que ali estão.
Vamos ler os textos esquecidos
Nos tempos de frente até atrás,
Vamos pintar o real nos panos, papéis,
Telas, papelões, assobios e muito mais!
Vamos reescrever os sinais!
Fio que nos ata agora, direto do centro do mundo,
Apóia, movimenta, dispara à vontade!
Servimos de sede à dança fértil e contagiosa
Do Desejo de toda gente nossa!"
Meditadores aproveitadores de momentos
Ouvem esses silenciosos sons da natureza
Esquecimentos e esquentamentos
Em meio ao barulho natural
Do mundo difícil movido a gasolina.
Chegam aos espaços e giram e giram e giram
E criam as danças e crianças de paz e guerra
Na cidade brava que aos poucos cede da máscara
Da dor à monstruosidade da felicidade.
Contra Polícia, Direito e Estado,
Dança, Poesia e Coragem versam
E queimam os dragões de maldade.
Dos homens ao feminino,
Das mulheres ao infinito,
Do desejo ao abismo,
O corpo inteiro da orquestra do caos contra a ditadura
Busca os pontos de equilíbrio, desequilibra e costura.
(Guebo)
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